quinta-feira, 24 de maio de 2018

História dos contos de fadas

FONTE: http://brasilescola.uhttp://brasilescola.uol.com.br/literatura/historia-dos-contos-fadas.htmol.com.br/literatura/historia-dos-contos-fadas.htm




História dos contos de fadas
Literatura

A história dos contos de fadas revela suas origens na tradição oral, compiladas por Charles Perrault, Irmãos Grimm e Hans Christian Andersen.
Você conhece a história dos contos de fadas?


These illustrations came from:
Lang, Andrew, ed. The Blue Fairy Book. H. J. Ford, illustrator. New York: Dover, 1965. (Original published 1889.) 

Os contos de fadas pertencem à Literatura Infantil, mas nem por isso deixam de encantar pessoas de várias idades ao redor do mundo. Considerados clássicos da literatura mundial, os contos de fadas têm origem em tempos remotos e nem sempre se apresentaram como os conhecemos hoje. O aspecto fantasioso e lúdico que hoje os envolve surgiu da necessidade de minimizar enredos controversos e polêmicos, próprios de uma época em que a civilização ainda não havia inventado o conceito que hoje conhecemos tão bem: a infância. Chamamos de contos de fadas porque são histórias que têm sua origem na cultura céltico-bretã, na qual a fada, um ser fantástico, tem importância fundamental.
A primeira coletânea de contos infantis surgiu no século XVII, na França, organizada pelo poeta e advogado Charles Perrault. As histórias recolhidas por Perrault tinham origem na tradição oral e até então não haviam sido documentadas. Oito estórias foram contempladas, A Bela Adormecida no Bosque; Chapeuzinho Vermelho; O Barba Azul; O Gato de Botas; As Fadas; Cinderela ou A Gata Borralheira; Henrique do Topete O Pequeno Polegar. Sendo assim, a Literatura Infantil como gênero literário nasceu com Charles Perrault, mas só seria amplamente difundida posteriormente, no século XVIII, a partir das pesquisas linguísticas realizadas na Alemanha pelos Irmãos Grimm (Jacob e Wilhelm).
Ao realizar suas pesquisas linguísticas, que tinham por objetivo descobrir invariantes linguísticas originárias nas narrativas orais, os Irmãos Grimm descobriram um variado acervo de histórias maravilhosas disseminadas de geração para geração. Formaram, assim, a coletânea que reuniu contos como A Bela Adormecida; Branca de Neve e os Sete Anões; Chapeuzinho Vermelho; A Gata Borralheira; O Ganso de Ouro; Os Sete Corvos; Os Músicos de Bremen; A Guardadora de Gansos; Joãozinho e Maria; O Pequeno Polegar; As Três Fiandeiras; O Príncipe Sapo e dezenas de outros contos. Contudo, ao documentar as estórias, os Irmãos Grimm, influenciados pelo ideário cristão que já dominava o pensamento da época, fizeram diversas alterações no enredo de alguns contos, já que esses muitas vezes apresentavam aspectos polêmicos com episódios de violência ou maldade, envolvendo, inclusive, crianças. Exemplo disso é a narrativa de Chapeuzinho Vermelho. Na versão de Charles Perrault, quando ainda não havia a preocupação em adaptar os contos recolhidos da tradição oral, não existia a figura do Caçador (figura que surge para salvar a menina e sua avó de um possível final trágico). Chapeuzinho Vermelho ficava nua, deitava-se com o lobo e morria devorada por ele. Em outra versão ainda mais obscura, a menina era enganada pelo lobo que a induzia a comer a própria avó cozida, além de beber seu sangue servido em uma taça de vinho. Bom, já deu para perceber que a estória que conhecemos é bem diferente da original, não é mesmo?




 Little Red Riding Hood by Warwick Goble

Na versão dos Irmãos Grimm, Chapeuzinho Vermelho e a avó são salvas, o que evita um desfecho trágico. Na versão de Perrault, elas não foram poupadas
O acervo da Literatura Infantil Clássica seria completado pelas histórias do dinamarquês Hans Christian Andersen, que seguiu a estrutura defendida pelos Irmãos Grimm. As estórias deveriam ser permeadas pelos mesmos ideais, defendendo valores morais e a fé cristã. Um aspecto importante difere as estórias de Andersen das narrativas anteriores, pois, baseado na fé cristã, criou elementos que falavam às crianças sobre a necessidade de compreender a vida como um caminho tortuoso a ser percorrido com retidão e resiliência para que enfim, na morte, o céu fosse alcançado. Os contos de Andersen são considerados os mais tristes, pois muitos deles não apresentam um final feliz. A história A Pequena Vendedora de Fósforos é um exemplo que ilustra bem o estilo de Andersen.




No conto de Hans Christian Andersen, a menina vendedora de fósforos morre de frio e de fome, ignorada pelos transeuntes.
Ao analisarmos a origem dos contos de fadas, podemos perceber as profundas alterações que o gênero sofreu ao longo do tempo, alterações feitas para diminuir o impacto negativo das estórias originais. Claro que devemos observar que os tempos eram outros e ainda não havia uma preocupação com aspectos lúdicos que hoje são tão importantes para a formação dos pequenos. Hoje é sabido que temáticas consideradas violentas podem influenciar negativamente as crianças e por isso não aceitamos a linguagem original empregada nas primeiras versões dos contos. Mas, em uma leitura mais atenta, ainda é possível perceber resquícios do universo assustador que habitava as estórias originais. Fica então um convite: revisite os clássicos infantis e descubra neles traços sombrios e sinistros que comprovarão uma origem nada romântica.



Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:
PEREZ, Luana Castro Alves. "História dos contos de fadas"; Brasil Escola. Disponível em <http://brasilescola.uol.com.br/literatura/historia-dos-contos-fadas.htm>. Acesso em 22 de maio de 2017.

Contos de fadas ensinam as crianças a lidar com seus medos




Reportagem
Contos de fadas ensinam as crianças a lidar com seus medos 

Hansel and Gretel
by Wunsch



Por Patrícia Mariuzzo
10/10/2007


“Boi, boi, boi, boi da cara preta, pega esta criança que tem medo de careta”. O universo das crianças é povoado de monstros. Em músicas, filmes, literatura infantil, os monstros são acionados das mais diversas maneiras. Eles não suscitam apenas medo, pânico, mas também paixão, fascínio. Isso acontece porque o boi, a bruxa, o lobo mau, o ogro, o gigante, todos eles são essenciais no desenvolvimento psíquico da criança. A infância é a época em que as fantasias precisam ser nutridas, é a época de em que há necessidade de inventar para enfrentar a realidade e disso vai depender boa parte da nossa personalidade futura. Os monstros são uma representação simbólica que a criança utiliza para lidar com a realidade e, assim como os outros personagens dos contos de fadas e fábulas com os quais a criança entra em contato na infância, eles são parte do imaginário, dão movimento, luz e som aos sonhos para, no fim, expulsar o medo do escuro.
As histórias são um pontapé inicial para uma vida mental saudável. Segundo o psicólogo austríaco Bruno Bettelheim (1903-1990) em A psicanálise dos contos de fadas, a verdade na vida de uma criança é diferente da noção de verdade do adulto. Os contos de fada não tentam descrever o mundo externo e a realidade. Uma criança sadia nunca acredita que esses contos descrevam o mundo realisticamente. Oferecer à criança pensamento racional para que ela organize seus sentimentos e compreenda o mundo só vai confundi-la e limitá-la. “A verdade dos contos de fada é a verdade da nossa imaginação”, diz ele em seu livro.


Carolina Caldas tem nove anos. Ao escrever um texto sobre monstros ela diz o seguinte: “Existem dois tipos de monstro: o da imaginação e o da realidade. Para mim o monstro da realidade é o mais medonho... porque ele é de verdade! As vezes é porque a pessoa é muito brava, feia ou chata. Por isso eu costumo considerá-la um monstro!” O pensamento infantil é naturalmente exagerado, nele tudo ganha proporções dramáticas. Nos contos de fadas, as crianças encontram semelhanças no modo de ver o mundo. Assim, elas depositam nos monstros seus medos advindos da consciência de que os adultos são seres separados delas, que nem sempre estão por perto e, o que é mais assustador, são vulneráveis. Para a psicóloga Adriana Mangabeira, do Colégio Equipe, da cidade de São Paulo, o jogo é, por excelência, a melhor situação para lidarem com isso. “Suponho que, para aceitarem o jogo, precisam discriminar o real do faz-de-conta, ou seja, embora sintam medo, sabem que no jogo é como se aquilo estivesse acontecendo. Na brincadeira, podem contrapor, ao medo e à excitação, a certeza de que estão seguros pelo amparo do adulto que as acompanha. Identificando-se com o monstro, são fortes. Fugindo dele e conseguindo se safar, dominam sua figura e seu medo dela. Em geral, repetem exaustivamente o contato com os enredos e as brincadeiras, obtendo cada vez maior controle da situação”, explica.


These illustrations came from:
Crane, Lucy, translator. Household Stories from the Collection of the Brothers Grimm. Walter Crane, illustrator. London: Macmillan & Co., 1882.

Ausência e separação 

Medo e excitação, realidade e fantasia se revezam nos jogos usados para entender o real. E, tanto no mundo real quanto no conto de fadas, é fundamental a presença do adulto, isto é, do pai, da mãe ou do educador. O grande potencial do conto de fadas é sua capacidade de falar, metaforicamente, sobre a estrutura familiar e sobre conflitos psíquicos naturais do ser humano, como o medo da morte ou o medo da separação. Segundo Celso Gutfreind, psiquiatra da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) psiquicamente o monstro é aquilo que desconhecemos, nos desagrada ou que não entendemos. “O medo do pai, a falta da mãe são coisas muito ameaçadoras para a criança”, explica. “O monstro é uma possibilidade de representar esses sentimentos. O contato com estas histórias permite às crianças falar sobre o assunto e elaborar os conflitos. É um pretexto para o diálogo”, acrescenta. Segundo Mangabeira, após a leitura de histórias do saci, curupira, mula-sem-cabeça, lobisomem etc. num grupo de trabalho do Colégio Equipe, as crianças ficaram mais à vontade para expressar seus sentimentos. “Elas se mostraram aliviadas por saber que os outros sentiam os mesmos medos que elas”, conta.
A relação da criança com seus pais e educadores é de amor e ódio. Esse ódio é natural, mas, culturalmente, não pode ser expresso. Em entrevista para a revista Época , os psicanalistas Diana e Mário Corso, autores do livro Fadas no divã , explicam que no pensamento infantil tem incesto, execuções sumárias e massacre de todos aqueles que se interpuserem entre a criança e seus desejos. “Os contos de fadas administram essa pequena loja de horrores da mesma forma que as crianças: neles tudo pode ser aludido, sem que nada tenha que ser explicitado”, disseram. O monstro do conto de fadas oferece uma possibilidade de representar esses afetos. Assim, por meio da bruxa, é possível dar sentido para o ódio sentido pela mãe, a vontade de morder, comum em toda criança, pode ser amenizada pela figura do lobo mau, com uma boca enorme, que devora a vovozinha.
O primeiro grande desafio da criança é criar vínculos com duas figuras principais: o pai e a mãe. Para ela se desenvolver bem, esse encontro com seus cuidadores tem que ser satisfatório, caso contrário podem ocorrer problemas psicológicos e físicos. O psiquiatra Celso Gutfreind participou de uma pesquisa em abrigos franceses para crianças separadas dos pais em caráter temporário, por medida judicial. Crianças com problemas de carência afetiva ou com problemas de transtorno de comportamento foram submetidas à terapia em grupo onde o mediador era o conto de fadas. A terapia era parte da política de saúde na França para promover a reaproximação com os pais. Segundo o pesquisador, as crianças tratadas progrediram significativamente. Um dos resultados foi incrementar o vínculo delas com o educador que assumiu o papel de representante, mas não substituto, da figura materna. “Além disso, por meio das histórias, pudemos manter viva a figura da mãe, a imagem da família, da qual eles estavam afastados”, explica. “A hora da leitura é um momento especial onde a criança recebe atenção total de seus pais, por isso é muito importante para ela. Os contos são um momento de aproximação que proporcionam um encontro real com o outro”, completa.
Shrek x Encantado 
O que é monstruoso ou o que gera medo varia de uma pessoa para outra, conforme a família, a cultura, a época. Na opinião de Gutfreind, violência, insegurança, solidão são os grandes medos dos nossos dias. “Nossa época é um tempo de grande quebra de vínculos. Dependendo do que nos amedronta, nos identificamos com um ou outro personagem”, diz ele. Ocorre, portanto, um processo de identificação muito particular que faz com que um monstro absolutamente ameaçador para uma criança, faça outra rir. Um exemplo dessa inversão acontece com a pequena Boo do filme Monstros S.A. . Ao invés de se assustar com a dupla de monstros Mike e Sullivan, a menina se afeiçoa a eles. O filme mostra ainda como as crianças de hoje não se assustam com qualquer coisa.
Outro exemplo de inversão está na trilogia Shrek onde os papéis de príncipe e monstro são trocados. O ogro é o herói e o belo cavaleiro é o vilão. Para Diana e Mário Corso, o que importa é que a ficção seja capaz de fazer a criança pensar e a faça ir adiante, que forneça elementos para que ela, ao mesmo tempo, solte sua imaginação e resolva seus conflitos. Segundo eles, a ficção que criamos e consumimos é eloqüente, ilustrativa, de um tempo e sua gente. As histórias infantis não prosperam se o que elas têm para oferecer não for o que serve ao seu público. Uma característica em comum de novos produtos culturais como Shrek Harry Potter e os contos de fadas é que eles tentam atingir pais e filhos, permitindo um diálogo entre as gerações. O medo do desconhecido continua por toda a vida, assim os adultos também precisam de metáforas para lidar com isso. A diferença é que no adulto a capacidade de diferenciar o que é real do que imaginário é mais desenvolvida.
A imaginação é um instrumento fundamental de elaboração e construção da nossa identidade. Sair de casa, expulsa pela madrasta, enfrentar um ogro, encontrar no amor a solução de todos os males, travar uma luta mortífera com figuras poderosas e aventurar-se na floresta, virar comida de uma bruxa; situações aparentemente absurdas podem ilustrar nossos conflitos inconscientes. “O mundo pode ter mudado totalmente, mas tornar-se mulher ou homem, assim como enfrentar o crescimento e a morte ainda são nossos problemas. No que diz respeito a essas questões, tudo mudou para que pudesse continuar do mesmo jeito”, finalizam Mário e Diana Corso.